terça-feira, 5 de maio de 2009

olhos de hortelã

Tenho um aluno, com seus 11 anos, que todos os dias, quase na hora do recreio, encaminha-se até a sala em que eu estiver dando aulas , me dá bom dia, um abraço, oferece uma bala de hortelã e, as vezes, quando estou a dar vistos nos cadernos, afaga-me os cabelos, prende os fios soltos atrás das orelhas, pergunta -me se preciso que compre algo na cantina e, quando atolada de pastas, cadernos, acompanha-me até a sala dos professores.

No começo , nem olhava para o guri. Depois os próprios colegas perceberam e daí para cá passei a observar melhor. Preocupei-me , a início, nem preciso citar os "porquês", mas depois, um dia, em sua sala de aula, falando sobre a importância da família com eles, soube ser o menino cuidado pela avó, embora de mãe viva. Segundo ele, ela nunca lhe dera nada, além da vida e que, segundo ele, nada seria, se não fosse pelos cuidados incansáveis da avó.

A sala ficou muito silenciosa, a esperar que eu me pronunciasse, claro. Como viram que eu nada declarei, logo inciou-se uma lista de opiniões. Ele ouviu algumas; comentou outras, e por fim deu o sinal e preferi me omitir. Não por nada ter a declarar, mas para não deixar aparecer a faca que tinha entalada na garganta.

E todos os dias lá estava ele a me cumprimentar, perguntar se precisava de algo, e acompanha-me , quando preciso, até a sala dos profesores. Preferi não comentar nada, proibe a sala, inclusive, de tocar no assunto novamente, embora sabendo , imaginando como seja difícil para ele digerir a ausência da mãe.

Tarde desta, fiquei sabendo que ele agrediu violentamente um colega. Socos, ponta-pés, recebeu advertência e chorou muito, pronunciou-se arrependido, segundo coordenadores e colegas. Não o vimos mais.

Manhã desta, ao encaminhar-me para a escola, ouvi alguém a chamar: "fessora, fessora...Percebi ser o guri do quinto ano. Recebi-lhe com mesma afeição de sempre; Perguntei-lhe que uniforme era aquele o qual vestia. Disse-me ter mudado de escola e que lá, era até melhor do que a anterior... Sorri. Percebi que estava realmente feliz. Cumprimentei a avó. Dei-lhe um abraço apertado. Ela ajeitou a mochila dele. Desejei sorte, a ambos. Ele me deu a tradicional bala de hortelã e, ao sair , quase ao atravessar a faixa, perguntou: " fessora: posso te chamar de mãe, quando te ver?"





Um comentário:

  1. Oi linda. Como estás.
    Passo sempre pelo teu blog. O Manuel vai indo, vai começar segunda feira quimio e radiotrapia. Tem sido um pesadelo, podes acreditar, todos os dias nas minhas orações peço a Deus que ele melhor para não o ver sofrer, e uma agonia constante. Penso se lhe a ontecer alguma coisa, minha vida muda.Peço a reforma por invalidez e vou para África,deixo tudo e vou -me encontrar com Deus, os filhos e netos ficam. Vou trabalhar como missionária. Um bj para ti querida e meninos, e continua na tua escrita que é o teu espírito.

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Sou um ponto Elemento visual real tantas vezes pequeno em relação a um plano maior. Um ponto que penetra espaços vazios de sentimentos emoções. Sozinha Sou apenas um ponto mas que ao aglutinar-me viajo no universos das possibilidades fusão do verbal com o visual na complexa sintaxe da vida.