sábado, 25 de setembro de 2010

A idade das descobertas

É difícil quando se chega aos cinqüenta, ainda mais quando se tem cabeça de 25, não pela leveza do ser, mas pelos incontáveis sonhos que os costuma florir.

Na verdade, imaginei que, ao se debulhar a idade, poderia desfrutar de algumas comodidades, feito minhas avós, mãe, tias, ou seja, a aposentadoria, o poder curtir a casa de praia, os amigos, sentir-me realizada ao ver os filhos crescidos, independentes, não precisar mais viver debaixo dos ponteiros do relógio a ditar-me os compromissos.
Não é conversa de quem está cansada, frustrada, não! trata-se afinal, de meio século de vida. Sabe o que é isso? Nascer, crescer, crescer, casar, procriar, cuidar e cuidar, esquecer-se de si, trabalhar, ver crescer e crescer os filhos e, finalmente , ganhar asas. Ambos! É aquela história do nascer, crescer, ter filhos, escrever um livro e morrer, pula esta parte.

Mas parece que, ser cinqüentenária no século atual, não é como o ser no tempo em que eu ainda era moçoila...Lembro-me de ter visto minha mãe jovem, adulta, senhora e agora, a contemplo idosa. Assim como lembro-me, perfeitamente, das flores colhidas ou arrancadas pelo vento, de cada estação por ela vivida; assim como dos espinhos que lhe espetavam as mãos, arrancava-lhe sangue, tantas vezes. E como admiro vê-la agora radiante, aos seus 84 anos, mesmo com o peso dos ossos, com a pele toda enrrugada, sozinha em seu jardim antes florido.
Assim como recordo, perfeitamente, de minha avó , com seus cabelos enormes, o penteá-los cuidadosamente e fazer o tradicional cóqui. A pele sem nenhum pó, beleza que vinha d”alma, assim como as de minha mãe e tias. Lembro-me, inclusive, do perfume de minha avó. O mesmo que se espalhava pelos quartos, nas roupas de dormir e que, numa quase doença, os tento manter ainda hoje em cada cômodo de minha memória, da casa, ao repetir o ritual. Não me recordo o dia em que as tenha visto, ao acordar, ainda de camisolas, desalinhadas. Mesmo quando acamadas, impossibilitadas, cuidavam-se antes de nos receber em seus aposentos.

Hoje, ao acordar, olhei-me atentamente ao espelho; pensei se algum filho tem observado as transformações por mim sofridas. Magrela sempre fui e parece que o serei. Mas as mãos, o rosto, os cabelos, estes , a cada dia se aperfeiçoam, sim adequam ao peso de meus ossos, a minha musculatura, perfil. E engraçado que, embora eu nunca as tenha perguntado, como se sentiam diante das mudanças, sinto-me perfeitamente conectada às minhas transformações. É algo que me faz bem, é como olhar o dia surgir a cada amanhecer e deitar-me, já altas horas, com o mesmo coração agradecido. Não temo envelhecer, temo mesmo é as pessoas que insistem em me tirar a paz conquistada. Não gosto de que me façam vestir como se ainda fosse uma moça; que me queiram esconder as imperfeições da pele com máscaras e pós sobre pós, cobrir os meus tão admiráveis cabelos brancos, imediatamente, embora os cubra desde os 25 ,devido a genética, quando todos da família os passam a possuir depois dos 20 anos, sabendo que, hora surge em que os poderei admiti-los, sem medo de ser taxada de cafona.

Não temo as mudanças advindas com o decorrer do relógio na parede; nas transformações que surgem no corpo, temo mesmo é forma cruel como alguns nos reparam e se desesperam diante do renovar da vida. Alguns passam a impressão de como estivéssemos nos desfazendo no tempo e vejo algumas colegas fazendo plástica até no umbigo. O medo do marido não amar mais seu corpo, de não arrumarem mais namorados. Cuidam do exterior e afogam seus desencantos, insatisfações, tantas vezes, em doses e doses de remédios para dormir.

Mudanças. Porque assustam tanto algumas pessoas? Porque perseguem , alguns, falsas aparências, esquecendo-se daquilo que nunca morre interiormente: a alegria verdadeira, o prazer de viver sabiamente, o viver cada momento como ele é, sem máscaras ou medicamentos. Infelizmente, ainda não se criou a plástica interior, a da renovação” almática”.

Breve serei cinqüentenária. Quero ser avó, no tempo certo. Quero conhecer meus netos e bisnetos, porque não tataranetos. Quero que, assim como minha geração, possam ver meu retrato na estante, parede, álbum de família e, ouvi-los dizer “como era bela, vovó! E sentir o afago de suas mãos dentro das minhas, seguros, certos de que atrás de meus cabelos brancos, minhas possíveis rugas, habita alguém que sobreviveu as intempéries da vida.
Ao nascer, deu-me Deus o sopro da vida. Ao morrer, quero devolvê-lo ao criador com a certeza de que meus dias foram cumpridos com garra e orgulho. Que sejam meus cabelos brancos, a seu devido tempo, o véu da pureza de minha alma, sempre criança.

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Sou um ponto Elemento visual real tantas vezes pequeno em relação a um plano maior. Um ponto que penetra espaços vazios de sentimentos emoções. Sozinha Sou apenas um ponto mas que ao aglutinar-me viajo no universos das possibilidades fusão do verbal com o visual na complexa sintaxe da vida.